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O que é que ‘Malcolm & Marie’ nos diz sobre relações emocionalmente abusivas?

11 Feb 2021
By Dra Peggy Drexler, psicóloga

Zendaya e John David Washington dão vida a um casal no mais recente filme do diretor da série Euphoria, Sam Levinson. A longa-metragem retrata uma noite de argumentos explosivos. A Dra. Peggy Drexler, psicóloga, partilha com a Vogue uma análise sobre aquilo que este filme nos diz sobre os relacionamentos tóxicos.

Zendaya e John David Washington dão vida a um casal no mais recente filme do diretor da série Euphoria, Sam Levinson. A longa-metragem retrata uma noite de argumentos explosivos. A Dra. Peggy Drexler, psicóloga, partilha com a Vogue uma análise sobre aquilo que este filme nos diz sobre os relacionamentos tóxicos.

Desde o início, o público que vê Malcolm & Marie, o novo filme de Sam Levinson na Netflix, com Zendaya e John David Washington, entende que os personagens principais têm uma relação tumultuosa - não apenas entre si, mas também com eles próprios. Ela é uma atriz com um passado de vícios e uma energia “boring” que encobre uma insegurança profunda; ele é um cineasta cujas próprias inseguranças se manifestam no abuso emocional que tem para com ela. A dinâmica deste casal vai muito além da diferença significativa de idades. Ele faz monólogos, ela ouve. Ele ocupa todo o ar na sala, enquanto ela, visivelmente, sufoca. 

A longa-metragem em si foi filmada durante a pandemia, mas como um todo, oferece uma metáfora para os relacionamentos durante o confinamento. A história desenrola-se em casa e, em grande parte, no decorrer de uma noite, onde as emoções percorrem toda a escala musical - com momentos tensos num minuto e logo de seguida momentos mais ternos e amorosos. O casal está preso naquela casa, naquela noite, nas suas próprias cabeças e na percepção que têm um do outro. Discutem, são cruéis, pedem desculpa e voltam a fazer tudo de novo. Fica claro que, tanto quanto se amam, também se odeiam. É uma montanha-russa insular sem um lugar concreto como destino. É uma relação com um grande bloqueio. 

Há muita mágoa entre Malcolm e Marie. A maior delas é o facto de Malcolm se ter esquecido de agradecer a Marie na estreia do filme que este escreveu baseado, em parte, na vida dela e que não a escolheu como protagonista, mesmo ela querendo este papel. Mas há muitas outras mágoas em curso. Malcolm recorda constantemente o passado de Marie com as drogas, a sua infidelidade, os momentos mais problemáticos; ela responde e afirma que o namorado é um cineasta medíocre e que concorda com uma crítica negativa. Mas, ainda assim, há algo que os faz voltar um para o outro. Alguma coisa que não é amor, mas sim co-dependência. 

Embora Malcolm & Marie não romantize inteiramente o que é claramente um relacionamento tóxico, repleto de abusos emocionais e explosões, também não faz muito para deixar claro quem é o culpado ou aquilo que deve ser feito. O par está claramente ligado um ao outro, as suas vidas estão interligadas, e é difícil sentir onde está o bem entre eles - mas enquanto público, temos que acreditar que há alguma coisa de bom, ou então qual é a razão para vermos este filme?

Ele é furioso, indiferente, narcisista e quer vencer todas as discussões; ela está emocionalmente danificada e sem reparo aparente, ficando ainda mais danificada no decorrer da noite, e do relacionamento (conforme confirmado repetidamente por Malcolm, que lhe diz “tira esse sorriso da cara, pareces um palhaço”, mas momentos depois diz que a ama). E ainda, no final do filme, após uma explosão no seu próprio monólogo eviscerente, em vez de abandonar Malcolm como é claro que sabe que é aquilo que deveria fazer, Marie decide ficar.

Isto é claramente uma descrição precisa de abuso. Estudos mostram que o abuso emocional, que pode incluir agressão verbal, dominação, controlo, isolamento ou o uso de conhecimento íntimo para a degradação - tudo o que vemos entre Malcolm e Marie - é comum. Aproximadamente metade dos americanos relatam ter sofrido de abuso emocional ao longo da vida por um parceiro. Entretanto, a pandemia e os confinamentos, agravaram a violência praticada pelos parceiros. Durante os pedidos de permanência em casa na Austrália, o Google relatou um aumento de 75% nas pesquisas relacionadas à ajuda para violência doméstica, um aumento que se repetiu em todo o mundo.

Mas, assim como costuma acontecer na vida real, embora seja fácil querer que Marie deixe Malcolm, também é fácil perceber o porquê de não o fazer. De acordo com a Linha Nacional de Violência Doméstica dos Estados Unidos, em média, uma mulher sai de um relacionamento sete vezes antes de sair definitivamente. No caso de Marie, há uma dependência: ela não têm ninguém além de Malcolm, que conhece os seus segredos mais profundos e sombrios e (como ele também recorda Marie) também foi ele que a ajudou a ficar limpa. Ele aponta para a tentava de suicídio dela como maneira de ela mostrar quão grata Marie deveria de estar. Todo o relacionamento é uma criação do seu trauma; ele acabou por substituir um vício por outro.

Um padrão como este é difícil de superar, mesmo fora de uma pandemia, dentro de uma e de todas as limitações, é quase impossível. Existem, é seguro presumir, centenas de milhares, senão milhões, de parceiros como Marie em relacionamentos que podem nunca deixar, mas certamente não o farão num momento em que o mundo está fechado e as oportunidades de fuga são escassas.

Malcolm & Marie não é uma história de amor, embora muitos possam olhar para ela como a história de uma relação ‘complicada’ entre duas pessoas que se sentem atraídas por razões que devem ser honradas. Caso contrário, enquanto isso, alguns podem ver isso como uma representação desencadeado de manipulação, de gaslighting, uma tragédia. É, no entanto, uma história verdadeira para muitos e um número crescente à medida que a pandemia avança. O que podemos aprender com este filme? Por um lado, que muitos de nós magoamos aqueles que mais amamos, e isso incluí-nos na equação. Por outro lado, ‘complicado’ e ‘abusivo’ são duas coisas muito diferentes.

Dra Peggy Drexler, psicóloga By Dra Peggy Drexler, psicóloga

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