Lifestyle   Tendências  

E viveram divorciados (mas felizes) para sempre

07 Jul 2022
By Pureza Fleming

Um divórcio nunca é uma situação para se celebrar. É o fim de um projeto de vida a dois que, pelas mais diversas razões, não correu conforme previsto. Mas se colocar um ponto final num casamento não é fácil, insistir numa união falhada pode ser muito pior.

Um divórcio nunca é uma situação para se celebrar. É o fim de um projeto de vida a dois que, pelas mais diversas razões, não correu conforme previsto. Mas se colocar um ponto final num casamento não é fácil, insistir numa união falhada pode ser muito pior. 

© iStock Photos
© iStock Photos

Click here for the English version.

Uma infância inteira de olhos postos nas princesas da Disney, com os seus lindos e longos vestidos, sempre acompanhadas pelos seus príncipes encantados, e o resultado é o que se esperava: mulheres sonhadoras que olham para o casamento como se este assinalasse um marco mágico a partir do qual se vive “feliz para sempre.” Esta é uma saga que continua pela vida fora. Também nas comédias românticas a que assistimos, entre um bocejar e o outro, nas enfadonhas tardes de domingo, o “the end” é invariavelmente antecedido pelo momento do casamento no qual o casal se prepara para “viver feliz para sempre.” A realidade, porém, é que deveria haver um “to be continued” em vez de “the end.” Porque o casamento não é o fim de nada, mas o início de tudo, de um outro tipo de história. Difícil? Sem dúvida. Desafiante? Supõe-se que sim. Mas feliz para sempre? Pode ser que sim, pode ser que não. E é aí que entra o divórcio. Na eventualidade do “feliz para sempre” dar lugar a um “tremendamente infeliz para sempre”, é preferível optar-se pelo “feliz e divorciado” — para sempre ou não. E, tal como acontece nos casamentos, alguns divórcios podem até revelar-se bastante risonhos. Não sendo, à partida, o sonho de ninguém, pode muito bem ser a via direta para uma vida de sonho — pelo menos mais plena, mais genuína. 

“Quando duas pessoas lutam por um projeto a dois, mas ao longo dos anos de vivência em comum acabam por alterar um bocadinho a sua maneira de ser de uma forma que não as faz ser felizes, as situações de menor harmonia começam a acontecer. Acho que essa é a principal razão pela qual as relações terminam. O meu caso foi precisamente esse. Houve um desgaste grande entre os dois e chegámos à conclusão de que, para continuarmos juntos, um de nós teria de abdicar da sua essência. E eu — e o meu ex-marido — considerámos que isso não fazia sentido e acabámos por optar por terminar esse projeto de vida a dois que era o nosso casamento.” As palavras são de Sofia Carvalhosa, divorciada e feliz com a decisão. Explica que há divórcios e divórcios e que considera o seu bastante positivo, especialmente quando comparado com muitas experiências que vê à sua volta. Acontece que, entre a noção de que as coisas possam estar mal, até à hipótese do divórcio, pode ir um longo e tortuoso caminho.

O papel do terapeuta, sublinha, é indicar diversos caminhos e ajudar o casal a chegar ao seu destino (...).

 

Afinal, como mencionou Sofia, trata-se de um projeto de vida e ninguém abdica de um grande projeto de ânimo leve. Fernando Eduardo Mesquita, psicólogo, sexólogo clínico e psicoterapeuta, elucida: “Alguns casais procuram ajuda no início dos problemas, outros apenas recorrem à ajuda especializada como última tentativa. Uma coisa é certa, por norma os casais que procuram ajuda mais cedo tendem a ultrapassar mais facilmente as dificuldades, pois não permitem que as mesmas se cristalizem e contaminem outras áreas da conjugalidade.” Garante assim que nem sempre a melhor solução para o casal é continuar e que, por vezes, o melhor para os parceiros é o afastamento. “A terapia poderá ajudá-los a encontrar formas de lidar com essa decisão”. O papel do terapeuta, sublinha, é indicar diversos caminhos e ajudar o casal a chegar ao seu destino: “Cabe aos parceiros decidir qual o caminho que desejam seguir, que pode ser tão variado como procurar reparar os danos na relação; melhorar diversas áreas da relação tais como a comunicação ou a intimidade; fazer uma terapia individual (se for caso disso); ou a separação. O papel do terapeuta é ajudar o casal a percorrer o caminho que decidiu.” Decisão essa que, no final, é sempre do casal, independentemente de opiniões terceiras. 

"Embora o terapeuta até possa ter ideia que a relação não faz sentido, essa é uma decisão exclusiva dos atores principais, que são os parceiros. Ou seja, um terapeuta não deverá atribuir juízos de valor, mesmo perante um casal com determinado tipo de atitudes e/ou comportamentos que vão contra os seus princípios morais ou éticos. Caso o terapeuta não consiga distanciar-se emocionalmente destes casos deverá procurar outro colega para referenciar o casal.” Pode ainda acontecer mesmo dentro do casal a discórdia “divorciar ou não divorciar, eis a questão.” E também nesse caso o terapeuta não pode fazer nada a não ser guiar. “Varia muito na forma como cada um dos intervenientes perceciona a relação. Alguns casais apresentam o divórcio como uma decisão e procuram o terapeuta no sentido de agilizar o processo em termos emocionais e de os ajudar a encontrar a melhor forma de lidarem com algumas questões que terão no futuro (por exemplo, cuidar dos filhos). Noutros casos, essa decisão pode ser apenas de um dos parceiros e o outro não aceitar tão bem o divórcio.” O melhor mesmo será, portanto, que a decisão seja tomada em conjunto, evitando assim desgaste e (ainda mais) sofrimento: “Quando a decisão é mútua, ninguém fica magoado. É claro que há uma parte que fica sempre mais triste do que a outra, um bocadinho também devido à maneira de ser de cada pessoa, mas não me parece que isso tenha acontecido connosco. Até porque continuamos a manter uma relação de amizade bastante forte e esse também é um dos segredos para que as coisas corram muito bem”, justifica Sofia Carvalhosa.

Mesmo quando a decisão não é tomada a dois, o psicólogo e sexólogo clínico insiste que “por muito que se goste de alguém, deve-se questionar se faz sentido permanecer numa relação onde não se é respeitado(a). Por vezes, por muito difícil que seja, a melhor decisão é a separação. Em alguns casos, os parceiros comunicam mais e entendem-se melhor após a separação. É caso para dizer que o divórcio uniu o que o casamento não conseguiu.” E quando há filhos pelo meio? A solução passa, mais uma vez, pelo bom senso e pelo respeito entre todas as partes. Sofia recorda: “Quando o pai da Inês e eu nos divorciámos, ela era muito pequenina. No início não é fácil, até para nós adultos, emocionalmente, sentirmos que ela vai um bocadinho para o outro lado, fica um bocadinho cá… Porque há realmente essa divisão. Mas eu sei que o Pedro sempre foi um pai espetacular, portanto nunca deixei de ter confiança quando ela não estava comigo — o que eu acho importantíssimo. E o sentimento é recíproco.” 

"Mas acho que, acima de tudo, é termos consciência que os filhos estão em primeiro lugar e que nós devemos — se quisermos ser pais — pensar neles e tentar todas as formas para que a vida deles seja harmoniosa e feliz."

Sofia considera que os filhos não devem nunca ser um peão no meio das negociações: “É obviamente uma situação de extrema importância… Qualquer divórcio significa o final de um percurso a dois e não necessariamente uma situação de corte radical ou de faltas de respeito. Esse é para mim um dos erros que a maioria das pessoas que têm divórcios menos bons comete. E isso espelha-se depois em tudo porque as pessoas ficam magoadas, ressentidas… Se há filhos ao barulho é péssimo porque infelizmente, e tal como podemos ver em muitas situações hoje em dia, acaba-se por usar os filhos como moeda de arremesso. E isso não é bom para a harmonia de qualquer ser humano acabando por se refletir na vida futura de todos”. E mantém: “Na minha perspetiva, e na do pai da minha filha, as bases essenciais para que a vida de um casal divorciado com filhos corra ‘sobre rodas’ passa por coisas tão simples como respeitarmo-nos um ao outro, respeitarmos a nossa filha, e tentarmos, sempre que possível, ter clareza quando pedimos alterações de datas, etc. Nós temos vidas muito pouco rotineiras e com horários muito diferentes da maioria das pessoas — até nisso poderia ser um desafio. E até hoje — e já lá vão mais de dez anos — a coisa tem corrido muito bem. É claro que do outro lado tenho uma pessoa extremamente organizada e que, confesso, é parte do segredo. Mas acho que, acima de tudo, é termos consciência que os filhos estão em primeiro lugar e que nós devemos — se quisermos ser pais — pensar neles e tentar todas as formas para que a vida deles seja harmoniosa e feliz. Acho que a felicidade é o segredo de qualquer situação, opção ou escolha nas nossas vidas. E não nos esquecermos nunca: num dia podemos ser nós a querer ser maus para o outro lado, mas depois a moeda de troca também existe. E, portanto, acho que é essencial pormo-nos no lugar uns dos outros e tentar fazer com que todos consigam ter aquilo que querem. Nem sempre é fácil, mas é só uma questão de coerência. E de sentimentos puros.”

Sendo o divórcio a última instância, por excelência, a figura do terapeuta de casal pode surgir bastante mais cedo na vida dos casais, numa ótica preventiva. “Disso mesmo são exemplo os programas de preparação para o casamento, embora ainda raros no nosso país, sendo que os mais conhecidos estão associados aos processos de preparação para casamentos religiosos”, explica Rita Fonseca de Castro, psicóloga clínica e terapeuta familiar, num texto publicado na Oficina da Psicologia.

Um estudo efetuado nos final dos anos 80 e conduzido por Linda Waite, socióloga da Universidade de Chicago, entrevistou 5.232 adultos casados: 645 relataram ser infelizes no casamento. Cinco anos depois, os mesmos adultos voltaram a ser entrevistados. Alguns tinham-se divorciado, outros separado e houve ainda os que permaneceram casados. O estudo — que de certa maneira desvaloriza o divórcio — concluiu que, em média, os adultos casados que se divorciaram não eram mais felizes do que os adultos que tinham permanecido casados. Mesmo os cônjuges infelizes que se tinham divorciado e voltado a casar não eram, em média, mais felizes do que aqueles que tinham permanecido casados. “Não se permanece casado apenas pelo bem dos filhos. O divórcio é necessário, mas resultados como estes sugerem que os benefícios do divórcio são sobrevalorizados”, rematou Waite. Um divórcio nunca é uma situação para ser celebrada — não deixa de ser o fim de um projeto de vida a dois. Mas é, sem margem para dúvidas, e muitíssimas vezes, o melhor itinerário. “Enquanto mãe divorciada há mais de dez anos, deixo este conselho: se nós [os pais] estivermos bem, os miúdos estão bem. Porque eles são umas esponjas, sentem tudo aquilo que nós sentimos e replicam isso na sua essência. Sobretudo crianças pequenas, que estão a começar a construir a sua maneira de ser, a sua forma de estar, e que guardam essas memórias para a vida. O conselho é estejam bem, porque se estiverem bem os miúdos crescem crianças felizes.” No final do dia todos nós só queremos uma coisa: viver felizes para sempre. Uma meta que se busca a todo o custo, quer se esteja casado, solteiro ou divorciado. Para sublinhar esse status, basta-nos o cartão de identidade.

Texto originalmente publicado no The Fairytale Issue, disponível aqui.

Pureza Fleming By Pureza Fleming

Relacionados


Curiosidades  

Os momentos mais caricatos das celebridades na história da Met Gala

30 Apr 2025

Compras  

Dia da Mãe | 15 cuidados de beleza para oferecer

30 Apr 2025

Tendências  

Os benefícios de caminhar durante as primeiras 3 horas do dia para produzir vitamina D e dormir melhor

29 Apr 2025

Atualidade  

O que lhe reservam os astros para a semana de 29 de abril a 5 de maio

29 Apr 2025