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Simon Porte Jacquemus, Francesco Risso, Kerby Jean-Raymond falam sobre o abrandamento da indústria da Moda

08 May 2020
By Emily Farra

A talk de ontem, 07 de maio, com Simon Porte Jacquemus, Kerby Jean-Raymond, da Pyer Moss, e Francesco Risso, de Marni, centrou-se na ideia da reinvenção: como é que a próxima geração de designers pode permanecer relevante durante uma crise?

Simon Porte Jacquemus, Kerby Jean-Raymond, Francesco Risso, Karla Martinez de Salas
Simon Porte Jacquemus, Kerby Jean-Raymond, Francesco Risso, Karla Martinez de Salas

A talk de ontem, 07 de maio, com Simon Porte Jacquemus, Kerby Jean-Raymond, da Pyer Moss, e Francesco Risso, de Marni, centrou-se na ideia da reinvenção: como é que a próxima geração de designers pode permanecer relevante durante uma crise? Não houve uma resposta, mas os três concordaram que o abrandamento e a reoritentação vão ser cruciais nos próximos meses (e anos). Com muitos de nós ainda em quarentena, os designers estão a conectar-se digitalmente com as suas comunidades via Instagram ou, no de caso Jean-Raymond, com um videoclipe que realizou com Wale. Jacquemus fez uma campanha com Barbie Ferreira e Bella Hadid, via FaceTime, a primeira da marca. “Era apenas uma maneira de dizer ainda é possível enviar uma mensagem e partilhar positividade e Moda”, afirmou.

A questão da relevância levou a uma discussão sobre outros aspetos da indústria - particularmente a Semana de Moda. Jacquemus, Jean-Raymond e Risso não são os primeiros designers a dizer que o ritmo do calendário se tornou muito intenso. Mas tornar a Semana de Moda novamente relevante não significa tornar-se totalmente virtual ou deixar as marcas mostrarem sempre que lhes apetecer. “Nenhum de nós estaria aqui sem a Semana de Moda”, apontou Jean-Raymond. “Quando as marcas grandes fazem um desfile durante um período específico, as marcas menores podem aproveitar a onda porque sabem que todos estão na cidade. Acho que o conceito dos desfiles precisa de mudar… Mas é uma entrada muito importante para os jovens designers.”

Promover a conexão com a comunidade começa na autenticidade

Não é segredo nenhum que a conta de Instagram de Jacquemus se tornou numa verdadeira sensação nos últimos anos. O designer francês mistura fotografias dos bastidores e dos desfiles com vislumbres da sua vida, além de fotografias de infância em Marselha e muitas selfies - tudo para uma audiência de 2,2 milhões de seguidores. Tornou-se uma parte essencial dos negócios do criador, mas Jacquemus insiste que não foi uma decisão consciente. “Não era um plano de marketing estar perto [da minha comunidade]”, afirmou. “Estou a partilhar tudo aquilo que amo e o que me faz feliz, não apenas Moda. Esta crise transformou o relacionamento mais forte com a minha comunidade.”

Jean-Raymond afirmou estar empenhado na criação vídeos com foco em questões que são mais importantes para os seus seguidores, como o racismo e a inclusão nos EUA. O vídeo que realizou, para a nova música de Wale, Sue Me, propôs como seria o mundo se a supremacia branca e a opressão negra fossem revertidas. Uma das cenas recria a prisão de dois homens afro-americanos, em 2018, num Starbucks da Filadélfia, mas com homens brancos. “É o meu primeiro vídeoclipe, mas não é a última coisa que estou a realizar”, afirmou o criador. “[Trata-se de] pensar com empatia um pelo e outro e, neste momento, isso é super importante.”

Risso falou da comunidade Marni e de como ficou inspirado pela criatividade da sua equipa durante a quarentena, mas enfatizou também a importância de convidar outras comunidades para participar. A colaboração com o grupo de bordados Miao, no sul da China, deve ser lançada nos próximos meses e vai apresentar as técnicas tradicionais do grupo a muitos ocidentais. O trabalho que fez com as bordadeiras serviu também como um lembrete para a importância do tempo. “É um conceito diferente para a cultura deles. Para nós [o tempo] é uma linha consequencial e, para eles, é tudo feito em camadas, quase como de uma sinfonia se tratasse”, disse Risso. “Fala sobre a história deles, a maneira como bordam e a preservação [dos seus artesanatos]. Conheci mulheres que fazem casacos bordados que demoram seis anos até estarem prontos.O nosso projeto foi interrompido, mas entendemos o valor que o tempo tem. Estou curioso para perceber o que é que isso significa para o futuro e [como posso] aplicar essa filosofia à marca.”

A Moda precisa de abrandar e os designers podem liderar o caminho

Desde que entrou para a Marni, Risso está interessado no tempo e no artesanato, e esse comprometimento manifestou-se novamente no trabalho que desenvolveu com os tecelões venezianos para a coleção do outono/inverno 2020 da Marni. Eles criaram as tapeçarias douradas que faziam parte em muitas das roupas apresentadas, um processo demorado. “Foram precisas muitas horas e, é definitivamente, contra a produção da Moda”, afirmou. “Mas é fundamental proteger esse artesanato, especialmente em países onde este tipo de trabalho corre o risco de desaparecer”. Obviamente, isto não é possível de realizar no atual calendário dos desfiles e da entrega das coleções, que dificilmente deixam espaço para a criatividade, muito menos para o artesanato que é honrado pelo tempo. “Temos que reconsiderar o calendário. Tornou-se tão intenso e seria prudente reduzir”, afirmou. “De certa forma, a Semana de Moda ficou muito fria, e as pessoas estão no telemóvel, ao invés de ver o desfile… Nós temos que tornar a experiência relevante, emocional e íntima.”

Jean-Raymond já se retirou da azáfama da Semana de Moda ao optar por fazer apenas um desfile por ano, ao invés de dois (ou, no caso de algumas marcas, mais de seis). “É tudo muito rápido - estás a seguir o teu próprio umbigo para teres novas ideias”, começou por dizer. “Achamos muito mais vantajoso criar um corpo de trabalho significativo e distribuí-lo ao longo do ano, ao invés de lançar quatro ou seis [coleções] enquanto as pessoas ainda se estão a atualizar no primeiro [lançamento]. A verdade é que não compramos roupas a esse ritmo. Temos que dar um tempo de incubação a uma coleção. Podemos comparar [esta situação] ao lançamento de músicas e filmes - um artista lança um álbum e precisas de dar um tempo para que esse trabalho amadureça aos olhos do público. Na Moda, nunca nos damos ao luxo do tempo.” O designer foi muito sincero sobre a “reação” que recebeu pela sua decisão - a lista de revendedores passou de mais de 100 para menos de 10, porque não queriam fazer um grande pedido de cada vez - mas a marca tornou-se muito mais ágil em colaborações, pop-ups e no direct-to-consumer.  

"Temos que reeducar toda a gente se queremos que as coisas mudem.” Simon Porte Jacquemus

Não há muito tempo, Jacquemus criava seis coleções por ano, mas, recentemente, mudou para duas. “Há um ano, decidi abrandar e pensar da maneira que os meus avós pensam - [coleções para] o verão e para o inverno, e não mais”, afirmou. “Foi muito refrescante para a minha equipa ter mais tempo. Foi uma jogada importante para nós e, agora, nesta crise, sentimo-nos de certa forma melhores [sobre o que fazer].” Simon Porte acrescentou que a indústria do luxo também precisa de aceitar parte da culpa pela cadência e excesso que existe na indústria. “É muito fácil dizer que tudo o que estamos a ver é ‘fast fashion’, mas para mim ‘fast fashion’ é ‘good fashion’ para alguém”, acrescentou. “A maneira como as pessoas consomem fast fashion é um problema, mas eles consomem a nossa Moda da mesma maneira. Temos que reeducar toda a gente se queremos que as coisas mudem.”

Precisamos dos desfiles, mas precisamos também de investir em experiências digitais

A questão que paira no ar ao longo desta talk, e na maioria das Vogue Global Conversations, é o que vai acontecer em setembro, durante a apresentação das coleções para a primavera/verão de 2021? Será possível que os desfiles aconteçam? Ou será tudo virtual? E quão realista é para uma marca produzir, no momento, uma coleção para a primavera/verão, com estúdios e fábricas ainda fechadas? Risso brincou com o conceito de quatro “happenings” digitais em Nova Iorque, Londres, Mião e Paris, “como uma espécie de quebra-cabeças, já que as pessoas não podem viajar”, explicou o diretor criativo da Marni. “Mas ver as roupas [pessoalmente] é algo que não podemos evitar. Não acredito na expressão virtual show. Temos que proteger os desfiles, mas, talvez, a dimensão deles tem que ser reconsiderada.”

"Temos que proteger os desfiles, mas, talvez, a dimensão deles tem que ser reconsiderada.” Francesco Risso

“Eu adoro os desfiles”, acrescentou Jacquemus. “Um desfile é como uma dança, tem emoção - não é apenas um lookbook. Já fiz desfiles na praia, no campo, com cavalos… É uma maneira de nos expressarmos. Alguns dos meus desfiles foram os melhores momentos da minha vida, não por causa dos aplausos ou do sucesso no Instagram, mas pela emoção. Estou nos bastidores a chorar com a minha família e a minha equipa e tenho muito boas emoções ligadas a esses desfiles. Acredito nos desfiles e na emoção dos mesmos.”

Os desfiles anuais de Jean-Raymond em Nova Iorque, têm sido incrivelmente emocionantes, principalmente, o desfile da primavera/verão 2020 com um coro ao vivo no Kings Theatre. Atualmente, o designer não tem planos de apresentar uma nova coleção até 2021, embora esteja a considerar como seria um programa até termos uma vacina para o Covid-19. “Como é que as roupas vão ser mostradas numa passerelle se os maquilhados têm mesmo de tocar nas modelos? Vão medir a temperatura à entrada dos eventos de Moda? Acho que essa vai ser a nossa realidade temporária”, disse. “Enquanto isso, o presente que estamos a viver em 2020 é a tecnologia. Com as oportunidades na internet, não será o mesmo [como um desfile], mas talvez possamos fazer uma combinação de eventos físicos com menos pessoas e eventos digitais em simultâneo. No passado, quando transmitimos os desfiles, era uma coisa mais passiva, mas acho que agora o foco vai ser criar esse conteúdo digital e gastar mais dinheiro no online. Temos que fazer a nossa parte enquanto seres humanos empáticos para reduzir a propagação deste vírus.”

Emily Farra By Emily Farra

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