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Trending: o futuro. Marian Salzman e as próximas tendências mundiais

28 Feb 2021
By Sara Andrade

Ele sempre foi incerto. Agora parece imprevisível. Mas não para todos: Marian Salzman é trends forecaster, isto é, identifica tendências vindouras, e diz que não vai tudo voltar ao que era. E isso não é necessariamente mau.

Ele sempre foi incerto. Agora parece imprevisível. Mas não para todos: Marian Salzman é trends forecaster, isto é, identifica tendências vindouras, e diz que não vai tudo voltar ao que era. E isso não é necessariamente mau.

© Branislav Simoncik

As edições de março são, por norma, edições dedicadas a tendências. É, por isso, mais que apropriado que nesta se fale daquela que é, agora, a maior e mais manifesta (ainda que imprevisível) tendência: o modo como vivemos. Não pensávamos muito nisso: com mais ou menos poder de compra, com mais ou menos férias, com mais ou menos guarda-roupa, com mais ou menos calor, com mais ou menos paciência, habituámo-nos a determinados parâmetros sociais, formas de trabalho e estilos de vida que tomámos como garantidos e que, ainda que se fossem alterando subliminarmente, manter-se-iam mais ou menos no reino daquilo que nos era familiar. Até que uma pandemia nos bateu à porta sem pedir licença nem limpar os pés ou desinfetar as mãos, naquilo que parecia ser uma terrível knock, knock joke, mostrando que  o que conhecemos se pode alterar num ápice… E que também há certos aspetos na vida que podem, e devem, ser alterados. Muitos não associariam esse bater ao som da oportunidade à porta. Mas Marian Salzman ouviu a campainha, alto e bom som, identificando um percurso de mudanças de comportamentos e maneiras de estar que devem exponenciar o nosso tempo em família, tanto quanto a nossa produtividade laboral, entre outras macrotendências que divulgou no seu Zoomsday Report, publicado em novembro de 2020.

Neste relatório com 11 trends (intimamente ligadas aos eventos que marcaram o ano passado e às alterações que vieram a introduzir no nosso quotidiano e na nossa relação com os outros e connosco) para os tempos que aí vêm, e que já se refletem mais ou menos timidamente, Salzman prevê que haja uma manifesta intenção de nos voltarmos para a comunidade e para nós mesmos, num zoom in que se quer como reflexo de um dia a dia que nos preencha mais, de uma vida mais focada nas pessoas e negócios ao nosso redor, ao mesmo tempo que fazemos o zoom out para não perdermos a big picture de tudo, o enquadramento maior, de forma a percebermos como podemos impactá-lo positivamente: “É o que eu chamo de ‘aproximar’ (zooming in) e ‘afastar’ (zooming out). Estamos a concentrar-nos na comunidade e nas pessoas próximas (família, amigos, trabalhadores essenciais, etc.)”, elabora a especialista em Comunicação e RP, trends forecaster e vice-presidente sénior de Comunicação da Philip Morris International. “Mas, ao mesmo tempo, estamos a ter uma visão mais ampla do mundo e do nosso lugar nele – e mostrando mais preocupação pelo meio ambiente e pelas pessoas que vivem longe de nós ou que são diferentes de nós em aspetos fundamentais. Portanto, embora estejamos a manter a distância física uns dos outros durante a pandemia, estamos a aproximar-nos emocionalmente e em termos do que priorizamos.” No seguimento disto, Salzman fala também da emergência de uma redefinição do essencial, ou seja, passaremos a exigir melhores condições, condições que nos preparem para imprevisibilidades do género e, ao mesmo tempo, manifestaremos uma maior preocupação com os outros, com a igualdade, com a justiça, principalmente pelos mais desprotegidos, tendo uma maior consciência do coletivo. Esta previsão de aproximação vai também ao encontro de outras listadas nestas 11 macrotendências – ou Salzman’s Eleven, chamemos-lhes assim: este zoom in também significa que regressamos ao “nós” e aos nossos, mas não de uma forma quantitativa, antes qualitativa, privilegiando conexões mais íntimas e não olhando a proximidade e conveniência, porque se há algo que este último ano nos ensinou é que podemos ser próximos sem estarmos próximos. Não é descabido, portanto, que nestas reflexões também se encontre o retorno ao que é autêntico, uma ideia que Marian refere como “o real que se torna irreal e vice-versa”: uma vez que o digital veio para ficar, isso vai ajudar, por um lado, a repensar o tempo e o espaço e, por outro, a forçar um limite à obrigatoriedade e pressão que o online acarreta.

O facto de termos de (em vez de querermos) marcar presença na Internet significa que vamos também ter necessidade de sair da rede para nos voltarmos para o analógico, para os clássicos, para o que é genuíno: “Espere um regresso à valorização da intelectualidade e de valores tradicionais como integridade e autosuficiência”, disse na apresentação do Zoomsday Report, numa tentativa de fugir a esta era de aparências. “No início da pandemia, os retalhistas relataram um aumento nas vendas de exemplares ‘analógicos’, como jogos de tabuleiro e quebra-cabeças. E bens como sementes de vegetais, fermento e farinha estavam em falta, apontando paraum interesse renovado em voltar a uma existência mais simples e desconectar-se da Internet para fazer algo ‘real’”, adianta Salzman. “Esta tendência [do regresso ao ‘real’] é para desacelerar e saborear a vida, mas também fala sobre a incerteza e o medo do desconhecido que estamos a viver. As pessoas querem mais controlo sobre a vida. Querem saber os ingredientes do que comem e bebem – e de onde vêm. Também querem poder fazer coisas simples como arranjar uma bicicleta, plantar vegetais, remendar as suas roupas. Não nos queremos sentir dependentes dos outros por muito tempo, porque não temos a certeza se podemos contar com eles para estarem lá quando precisarmos.” E continua: “A nossa apreciação e reconhecimento da importância dos pequenos negócios nas nossas vidas também permanecerá pós-pandemia. Temos um melhor entendimento do quanto as nossas comunidades dependem de uma infraestrutura saudável para pequenas empresas. Portanto, tanto em termos de manufatura quanto de consumo, procuraremos bens de fontes locais. Também vimos um aumento do interesse em atividades ao ar livre – de caminhadas e acampamentos, a caiaque e observação de pássaros. As pessoas cansaram-se de ficar presas nas suas ‘bolhas’ socialmente distantes. Elas querem sair e explorar, e isso tem sido uma coisa boa para os fabricantes de equipamentos desportivos. Mesmo antes da pandemia, víamos um retorno ao analógico com o aumento das vendas de discos de vinil. Os bons profissionais de marketing encontrarão maneiras de atualizar produtos antigos para alcançar novos públicos.”

“QUALQUER ANALISTA DE TENDÊNCIAS QUE NÃO ADMITE COMETER UM ERRO OCASIONAL NÃO ESTÁ A SER TOTALMENTE HONESTO. TIVE ALGUNS, GRANDES, AO LONGO DOS ANOS, INCLUINDO UMA ENTREVISTA HÁ MUITO TEMPO EM QUE DISSE A UM REPÓRTER QUE NÃO ACHAVA QUE A AMAZON SERIA LUCRATIVA. UPS.” - Marian Salzman

No caso do repensar tempo e espaço, isto significa que, com o advento (e a realidade) do teletrabalho e de um burnout intimamente ligado à ansiedade e pressão provocados pela quarentena, podemos ver uma divisão mais alargada entre trabalho e família, com a redução da semana de trabalho para quatro dias úteis, reservando 24 horas extra para focar a atenção nos entes queridos. Esta realidade pode ser também causa e consequência de outra macrotendência nestas Salzman’s Eleven, que se prende com a reorganização e descentralização dos lugares, promovendo um êxodo citadino e repensando os centros urbanos como lugares de lazer e não apenas de negócios, uma vez que o confinamento mostrou que o local não é tão importante quanto as ferramentas digitais que nos permitem manter a produtividade sem a poluição, trânsito, rendas insuportáveis, variantes até agora toleradas pelas vantagens da oferta de comércio, educação e emprego das cidades. Oferta que agora deixa de estar limitada por fronteiras físicas e às quais se pode aceder de zonas mais remotas, nomeadamente áreas que disponibilizam qualidade de vida, tanto em paisagem como em orçamento. É óbvio que esta realidade vem à custa de uma automação do trabalho cada vez mais palpável, caminhando a passos largos para a era dos drones e dos droids, adverte a especialista, porque a Internet salva – mas a que custo? Salzman aborda ainda a questão da migração da vida para o digital e as potenciais consequências dessa passagem, nomeadamente o que podemos perder – como por exemplo, conhecimentos e talentos de manufatura, assumindo que no futuro as aulas sobre este género de skills podem ter uma maior procura. Até porque, numa das suas onze, Marian prevê que vamos passar a estar “sempre prontos para a batalha”, planeando e preocupando-nos tanto em termos mentais e físicos como financeiramente, para eventos que nos apanhem de surpresa – e isso significa apurar a autossuficiência com técnicas de bricolage e outras práticas úteis, bem como acautelar kits de emergência.

Estas são algumas das guidelines do que aí vem, prevê Salzman. Guidelines que não aparecem do nada: prever tendências não é apenas mandar umas opiniões-em-modo-verdade-absoluta sobre o que se acha que se está a passar, como fazem muito editores de sofá e videntes de social media, munidos da autoridade que só um ecrã de computador lhes dá. A previsão de tendências é uma poderosa ferramenta sociológica reservada apenas a alguns com arcabouço para tal (Marian é um deles) e com fundamentos científicos que vão além de uma veia de sabichão que parece assolar largamente a população mundial. “Eu não posso falar por todos os analistas de tendências. No meu caso, estudei Sociologia e comecei a minha carreira como investigadora de mercado, mas diria que segui esses caminhos porque naturalmente sempre me interessei pelo comportamento humano e por tendências. Adoro detetar padrões entre acontecimentos aparentemente desconexos e descobrir o que tudo isso pode significar. E daí tento criar uma história ou narrativa que ajude outras pessoas a compreender o que estou a ver”, elucida Salzman. “Quanto ao meu processo, combino observação com uma ‘dieta’ extremamente abrangente dos media, recorrendo a dados concretos para apoiar o que vejo. Quando estás a identificar tendências para negócios, tens de ser capaz de sustentar o teu palpite – ou, pelo menos, apresentar bons argumentos para justificar à empresa o porquê de monitorizar uma determinada tendência emergente que identificaste. Já faço isto há muitos anos. Quando era mais nova, a minha especialidade eram tendências de lifestyle – coisas como género, moda, estilo e beleza. À medida que os anos passam, é mais provável que observe as tendências geopolíticas e económicas e as grandes mudanças sociais. Uma coisa que não mudou é que este é um processo contínuo: estou sempre à procura de tendências emergentes e a averiguar como as tendências anteriores se manifestaram. Novas tendências podem ser construídas a partir de previsões anteriores, por isso, por vezes regresso aonde estivemos para fazer um esboço de para onde caminhamos. Não há, claramente, um cronograma definido. Algumas tendências duram pouco, o que na maioria dos casos significa que devem ser classificadas como modas passageiras. Outras desenvolvem-se e assumem novas formas ao longo das décadas. É necessário pensar um pouco para unir os pontos todos. Em 2021, estou a ter em conta como a tendência da metrossexualidade que identifiquei em 2002-2003 influenciou a indefinição de género, que, por sua vez, é um fator que contribui para os movimentos populistas e nacionalistas atuais. Muitos homens estão zangados porque a sua masculinidade está a ser marginalizada – e isso às vezes expressa-se através de violência e tendências antidemocráticas.”

Este género de destreza para identificar novos estilos de vida e comportamentos na sociedade com tamanha antecedência só vem com a experiência. E Salzman tem o CV para o comprovar. “Trabalhei, ao longo de mais de três décadas, para grupos de publicidade, comunicação de marca e relações públicas, incluindo a Havas PR North America (onde fui CEO ao longo de uma década), Euro RSCG Worldwide (Havas Creative), JWT, Porter Novelli, Y&R e TBWA \ Chiat \ Day. Muito cedo na carreira, fui empresária; fui co-fundadora do American Dialogue/ Cyberdialogue, através do qual geri os primeiros grupos de discussão online do mundo, no início dos anos 90. Eu era uma cybergeek antes de a maioria das pessoas saber como entrar na autoestrada da informação”, confessa, sublinhando algo que merece um marcado destaque nesta conversa: “O propósito é importante para mim. Quando liderei a Havas PR North America, criei políticas para garantir que estávamos a colocar, em bom uso, as nossas capacidades de comunicação em causas que eram importantes para nós. Nós ajudámos a lançar o #GivingTuesday, por exemplo, e antes disso recolhemos fundos para reconstruir o Haiti após o devastador terramoto de 2010. Também incentivei as empresas nossas clientes a procurar um propósito que fosse além dos lucros.” Aliás, esta é outra das macrotendências que refere na sua lista de onze, ou seja, as empresas devem ser agentes de mudança, que vem um pouco no seguimento da redefinição do que é essencial e da exigência por um mundo mais justo. “Esta pandemia aguçou o apetite do público por mudanças. Destacou coisas que negligenciámos por muito tempo, como disparidades de riqueza e injustiça racial. Como resultado de tudo o que passámos, estamos mais atentos às pessoas ao nosso redor e menos tolerantes com as desigualdades sistémicas. Estamos menos dispostos a fechar os olhos para aqueles a quem a sociedade está a falhar”, aponta Salzman.

Como será 2021? “Em 2021, podemos esperar um maior apoio à justiça racial e económica, partilha de recursos e discussões sérias de conceitos antes rejeitados como radicais, como um salário base universal (UBI - Universal Basic Income). Mesmo nos EUA, a noção de um UBI passou de uma fantasia periférica e de extrema esquerda para o que muitos consideram uma solução de bom senso. Quando o caos reina, as pessoas querem proteção.” E relembra: “Há alguns anos, mais de metade das entidades mais ricas do mundo eram corporações. Com empresas com enorme poder financeiro, é justo que as pessoas olhem na sua direção em busca de ajuda para enfrentarem os desafios que temos pela frente. E agora, enquanto vivemos esta trilogia de crises – a pandemia, a agitação social e a convulsão económica além da ameaça das mudanças climáticas –, as empresas realmente não têm escolha a não ser tornarem-se, não apenas mais social e ambientalmente responsáveis, mas mais social e ambientalmente proativas. Os consumidores têm pouca paciência para marcas que parecem não ‘entender’ o que se passa. Anúncios sem noção e posts questionáveis nas redes sociais são denunciados – muitas vezes com exigências de ação imediata (por exemplo, ‘despedir aquele executivo’, ‘boicotar aquela empresa’). As pessoas estão a repensar a sua lealdade para com a marca com base no comportamento responsável das empresas durante a pandemia. Elas querem saber que as marcas que apoiam colocam as pessoas acima dos resultados financeiros. As gerações mais jovens estão absolutamente apaixonadas pela igualdade e pelo planeta – da corajosa ativista de género Malala Yousafzai à estóica e direta guerreira ambiental Greta Thunberg. Por isso, sim, veremos essas questões tornarem-se cada vez mais importantes e proeminentes, pós-pandemia e mais além. Várias das minhas tendências para 2020 e 2021 abordaram estas questões – incluindo repensar as cidades para garantir mais espaço verde e habitação acessível, redefinindo o que é essencial, desapegar mais e consumir menos, e abraçar o ‘nós’ em vez do ‘eu’."

O que faz uma trends forecaster ligada a um dos game changers de hoje na indústria do tabaco? O seu trabalho – com um propósito, como defende que deve ser: “Em 2018, decidi fazer a diferença dentro de uma empresa em vez de [estar apenas] como consultora externa. Vou ser honesta, quando a Philip Morris International (PMI) me contactou pela primeira vez, eu tinha zero interesse em trabalhar com eles – muito menos para eles. Mas, à medida que aprendi mais sobre a sua nova missão – tornar os cigarros uma coisa do passado e criar um futuro sem fumo – reconheci que essa era uma oportunidade enorme demais para deixar passar. Eu podia ingressar numa organização que tem a visão de inspirar uma mudança que verá centenas de milhões de adultos – que, de outra forma, continuariam a fumar – substituírem os cigarros por alternativas de risco reduzido. Eu podia contribuir para o que será um dos maiores avanços na saúde pública deste século. Como é que poderia deixar isso passar? Por isso, fiz as malas e mudei-me para a Suíça. E, agora, como vice-presidente sénior de comunicações globais da PMI, trabalho todos os dias para criar um ambiente – em atitude e regulatório – no qual os adultos, que, de outra forma, continuariam a fumar, são encorajados a mudar para alternativas menos prejudiciais que a ciência disponibilizou. Para ser clara, as alternativas sem fumo não são isentas de riscos e a melhor escolha que qualquer pessoa pode fazer é nunca começar a fumar ou, se o fizerem, abandonar totalmente a nicotina e o tabaco. Mas sabemos que, qualquer que seja o ano, muitos não desistem. Até a Organização Mundial de Saúde estima que, em 2025, haverá aproximadamente o mesmo número de fumadores em todo o mundo que existe hoje em dia. Para aqueles milhões de adultos que, de outra forma, continuariam a fumar, queremos garantir que têm acesso a informações precisas sobre alternativas, com base científica, livres de fumo, que são uma opção melhor do que os cigarros.” Esta é uma macrotendência que não olha a pandemia ou fatores externos – ou melhor dizendo, é um objetivo que, espera Marian, se torne numa macrotendência. “Estamos empenhados em criar um futuro sem fumo, mas não podemos fazer isso sozinhos. Permitir que milhões de fumadores mudem dos cigarros para alternativas melhores requer o apoio de reguladores e legisladores. De momento, a formulação de políticas de tabaco está a ser seriamente prejudicada pela ideologia, muitas vezes com pouca ou nenhuma consideração pela ciência e pelos factos. O vasto corpo de evidências científicas e dados relacionados com as alternativas smoke free aos cigarros é amplamente ignorado por alguns grupos de interesses especiais, incluindo aqueles com influência na Organização Mundial de Saúde”, defende, não deixando margem para dúvidas que veste a camisola da PMI, uma com um propósito de respeito. “Esses grupos parecem estar focados em ‘derrotar’ a indústria do tabaco, em vez de promoverem as melhores soluções políticas para melhorar a saúde pública. Em qualquer outro setor, isso não seria aceitável – e também não é aceitável no setor do tabaco. Qualquer pessoa que se dê ao trabalho de rever os estudos científicos que existem hoje em dia entende o enorme potencial que esses produtos apresentam para homens e mulheres que fumam. Produtos antifumo não são isentos de riscos, mas quando estão sujeitos a padrões de segurança e qualidade, são uma escolha muito melhor do que continuar a fumar. As alternativas aos cigarros, inovadoras e com base na ciência, têm um enorme potencial de redução de danos. Aqueles que criam as políticas precisam de reconhecer que nem todos os produtos do tabaco são igualmente prejudiciais. Dadas todas as evidências científicas disponíveis hoje, posicionar todos os produtos como tendo o mesmo grau de risco é simplesmente falso. É desinformação – e representa um grande dano para os adultos que não querem largar o cigarro na ausência de uma alternativa melhor.”

Um objetivo que, se depender da sua tenacidade, irá conseguir. Não porque as suas previsões são infalíveis, porque nunca são, mas porque o que a move é maior do que qualquer macrotendência: é o propósito e a vontade de se superar a si própria. Os erros pelo caminho, esses, apanha-os e transforma-os em aprendizagem: “Qualquer analista de tendências que não admite cometer um erro ocasional não está a ser totalmente honesto. Tive alguns, grandes, ao longo dos anos, incluindo uma entrevista há muito tempo em que disse a um repórter que não achava que a Amazon seria lucrativa. Ups”, responde com uma honestidade sem igual. “Mais usualmente, as previsões são ligeiramente erradas ou prematuras. O meu relatório de tendências para 2020 dizia que mais pessoas estariam a armazenar produtos essenciais e a usar máscaras de proteção. O que eu não tinha como saber na época em que escrevi isso, no final de 2019, é que essas tendências se acelerariam por causa de um novo coronavírus. Achei que mais pessoas usariam máscaras por causa de uma maior preocupação com a qualidade do ar e estariam a armazenar mercadorias como parte da ‘mentalidade de bunker’ generalizada, que tenho abordado nestes últimos anos. Portanto, embora a deteção de tendências estivesse correta, o raciocínio estava errado. Não me arrependo de nenhum caminho errado que tomei. Tudo isso faz parte do processo de aprendizagem”, confessa. O que não deverá ser o caso do seu Zoomsday Report, que parece já se manifestar a passos largos como correto, com muitos dos pontos que refere a terem já expressão nas conversas na ordem do dia – uma delas, a questão da saúde mental e uma predisposição para nos prepararmos para tudo: “Esperam-se mais pandemias, clima extremo e mais medo. Preocupo-me muito com a nossa saúde mental coletiva; será que algum dia nos sentiremos seguros novamente? Somos melhores no tratamento de problemas imediatos do que em nos condicionarmos a suportar o imprevisto. O medo do desconhecido sempre foi uma fraqueza humana. A pandemia, no entanto, levou a mudanças práticas relacionadas com a saúde e a segurança. As pessoas vão formar novos hábitos, uma vez que agora estão mais conscientes da necessidade de proteger a sua saúde mental e o bem-estar. Após a pandemia, podemos esperar que o stress perpétuo e até mesmo o PTSD (síndrome de stress pós-traumático) se tornem mais aparentes. A longo prazo, veremos um maior investimento – por parte de indivíduos, empresas e governos – em saúde emocional e mental”, alerta Salzman.

Não é à toa que uma das tendências é estarmos preparados para tudo. Em teoria. E na prática? “Nunca estaremos preparados para tudo. O mundo é demasiado complicado e move-se demasiado rápido para tal. Vamos concentrar-nos mais em ensinar resiliência. Veremos isso tanto a nível organizacional – com os empregadores a requalificar os funcionários para se adaptarem a uma variedade de futuros possíveis – como a um nível pessoal, já que as escolas e famílias priorizam a tenacidade e a determinação lado a lado com a criatividade e o pensamento crítico. A memória pode ser curta, mas não vamos ignorar esta pandemia da mesma forma que fizemos com as crises anteriores. Não afetou apenas uma parte das pessoas de uma maneira limitada. Não é como uma crise económica de curto prazo. Isto está a acontecer há meses e meses – e vai durar muitos meses mais – e afetou praticamente todo mundo. A forma como trabalhamos foi afetada. A maneira como vivemos foi afetada. O modo como comunicamos e socializamos foi afetado. As nossas vidas passaram por uma mudança fundamental desde março de 2020, e não haverá como voltar ao velho ‘normal’." Mas, reiteramos, isso não é necessariamente mau. “As tendências costumam ser aspiracionais, refletindo os esforços que estamos a fazer para melhorar as nossas vidas e o nosso mundo. Podemos ver isso na tendência contínua de consumo consciente. E, mesmo dentro de tendências e eventos mais sombrios, incluindo esta pandemia, geralmente procuro uma ‘fresta de esperança’ – algo positivo que resultará disso. Então, sim, acredito que as tendências podem ser vistas como uma janela para uma vida melhor. […] Deteto tendências analisando dados e padrões de comportamento. Supondo que nós, seres humanos, estamos continuamente a esforçarmo-nos para fazer melhor, para viver melhor, para melhorar as nossas circunstâncias, seria natural concluir que as tendências se movem nessa direção também.”

Conclusão: vamos todos ficar bem. Ou vamos tentar caminhar para tal, o mais possível. Não é à toa que a 11.ª e última macrotendência na lista do Zoomsday Report seja “fazer as pazes com a incerteza”,  ou, por outras palavras, termos noção de que o pior pode acontecer, mas termos a esperança de que não vai acontecer, usando a prevenção ao máximo e não nos deixando ser reféns do medo – antes procurando retirar o melhor da situação, dentro daquilo que sentimos ser o mais seguro para nós em tempos incertos. “A tendência mais abrangente que estamos a testemunhar como resultado desta pandemia é uma reavaliação em larga escala de como estamos a viver e o que queremos da vida. O COVID-19 deu-nos a oportunidade de aproveitar não o dia (carpe diem), mas a pausa (carpe mora). As nossas vidas programadas foram interrompidas e isso abriu-nos para novas possibilidades – ao mesmo tempo que nos deu tempo para considerar o quão satisfeitos estávamos com a nossa vida antes da pandemia. Veremos muitas pessoas fazerem mudanças dramáticas nas suas vidas – seja a mudar de carreira, a voltar a estudar, a terminar ou a recomeçar relações, a mudarem-se para um novo local ou a alterarem por completo o seu estilo de vida. Aristóteles disse: ‘A vida não analisada não vale a pena ser vivida’, mas a maioria de nós concordaria que andámos demasiado apressados – muito ocupados com os nossos empregos e deslocações, as nossas responsabilidades domésticas e tentando acompanhar o fluxo assustador de informações que nos é atirado – para podermos reservar um tempo para pensar profundamente sobre as nossas vidas e se estamos felizes com elas. Esta é a nossa oportunidade de fazer mudanças significativas – para nós mesmos e para as nossas comunidades, até mesmo para a sociedade.” Marian Salzman sabe como sair de uma entrevista, deixando o arco-íris que todos andámos a partilhar numa resposta. E prova do que defende são os exemplos práticos de quem já adotou algumas destas tendências – e que a Vogue explorará e mostrará numa edição posterior. O futuro está trending, porque o futuro é agora.

*Artigo originalmente publicado no Creativity issue da Vogue Portugal, de março 2021.For the english version, here.

Sara Andrade By Sara Andrade

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