Há cerca de 700 mil portugueses a viver na região de Paris, e a história de cada um deles merecia estar nestas páginas. Como o papel é pouco para tanto amor, a Vogue esteve com nove nomes que fazem mover o motor da Moda e da cultura parisiense, ao mesmo tempo que o coração vermelho e verde ainda se aninha numa gaiola dourada.
Há cerca de 700 mil portugueses a viver na região de Paris, e a história de cada um deles merecia estar nestas páginas. Como o papel é pouco para tanto amor, a Vogue esteve com nove nomes que fazem mover o motor da Moda e da cultura parisiense, ao mesmo tempo que o coração vermelho e verde ainda se aninha numa gaiola dourada. Fotografia de Anne Piqué. Realização de Nelly Gonçalves.*
Nelly Gonçalves
30 anos, stylist.
“Portugal sempre esteve presente no meu dia a dia desde criança. Tenho uma grande família e sempre convivemos juntos. Em casa falavam‑me sempre em português… mas eu respondia em francês. Tinha aulas de português uma vez por semana, mesmo assim continuava a responder em francês. Não nasci em Portugal nem ligava muito quando era mais nova. Os meus pais e familiares fizeram-me amar o País e conhecer as minhas raízes. Mas sempre soube que acima de tudo era portuguesa e nunca tive vergonha de o dizer. As férias foram sempre em Monção e lembro-me ainda de ter de atravessar o rio num minibarco entre Espanha e Portugal depois de 15 horas de viagem. Passar à frente da placa ‘Portugal’ era e ainda é emocionante. A alegria dos meus pais ao regressar à terra deles não tem descrição, sempre me emocionou. Há oito anos tudo mudou. Comecei a viajar e a conhecer o País pelos meus próprios olhos. Descobri um Portugal que não conhecia. Hoje tenho um dia a dia igual ao de um português em Portugal. Como se vive e se trabalha. Encontrei uma nova família de amigos. Escolher entre os dois países é impossível. Quando estou em Portugal sinto falta de França e vice‑versa. Agora já passei a sonhar em português e pouco em francês. Recebi uma educação portuguesa em França. Sou e sinto-me portuguesa. Como costumo dizer: o meu coração e o sangue são portugueses e a minha cabeça é francesa.”
Anne Amorim
33 anos, PR manager na Zadig&Voltaire.
“Sempre tive uma ligação muito forte com a minha origem portuguesa. Sempre me senti tanto francesa como portuguesa. Quando estão quase a chegar as férias do verão, fico ansiosa pelo meu ‘querido mês de agosto’, sempre fui de férias em agosto para Portugal desde pequena, como a maior parte dos luso‑descendentes, e essa tradição ou ritual continua sempre em mim. Não imagino não ir em agosto para Portugal. Mantenho uma ponte sólida com Portugal ao nível pessoal e profissional. Tento ir uma vez por mês a Lisboa (o meu pai é de Lisboa, minha mãe de Fafe), passar um fim de semana em casa. Preciso para carregar a minha energia, matar saudades dos meus amigos. E tenho também muita sorte de associar as minhas origens ao meu trabalho. Sou muito dedicada à evolução da marca no mercado português. No meu dia a dia vivo num ambiente cultural bipartido. Na minha casa, cada canto é uma portugalidade, através de fotos antigas de Lisboa, objetos tradicionais/vintage, vinis de música portuguesas que compro quando estou cá. Na cultura portuguesa, a família é sagrada, então tenho isso em mim, um valor importante que os meus pais me transmitiram. Vejo os meus pais todos os fins de semana, um jantar ou almoço com eles, com a minha irmã, cunhada e sobrinha. Gosto de ver as notícias (tenho os canais portugueses), e tanto sempre manter-me em dia com o que se passa em Portugal. Outro ponto que faz parte do meu dia a dia: as compras. Temos em Paris uma forte emigração portuguesa, então é fácil de encontrar produtos alimentares, o que é uma maravilha! Quando vou aos domingos ao mercado, há um stand onde vou sempre comprar produtos básicos. Aproveito sempre para comprar por exemplo vinho para quando vou jantar a casa de uns amigos ou quando amigos jantam na minha, gosto de os fazer descobrir e eles adoram!”
Créditos | Anne: vestido em lã fria, ZADIG&VOLTAIRE. Brincos em bronze, ZADIG&VOLTAIRE X ANNELISE MICHELSON. Anéis e pulseiras em bronze e prata, da própria, ZADIG & VOLTAIRE. Roos: casaco em pele, € 995, camisola em malha de algodão, € 270, e saia em pele, € 495, tudo COURRÈGES. Na página ao lado: Fátima: casaco em algodão feltrado, MULBERRY. Roos: top em algodão e calças em crepe de seda, ambos NINA RICCI. Sapatos, Floyd, em pele, € 525, TIBI.
Fátima Gonçalves
32 anos, Press & PR Officer na Station Service.
Nasceu na Suíça, viveu 10 anos em Portugal e está em Paris há mais de três. “Não diria que viver em Paris seja muito diferente de viver em Lisboa, ambas são capitais europeias bastante turísticas e com um fator cultural forte, o que faz que em cada uma delas possamos encontrar pontos em comum. Talvez Paris pareça mais majestosa pela sua arquitetura e pela dimensão dos monumentos, mas Lisboa ganha sem dúvida pela luz, pelo calor e pela proximidade do mar. Lembro-me que nos meus primeiros passeios pela cidade (Paris) sentia-me como num filme, talvez porque conheci Paris através do cinema francês. De facto ainda em Lisboa, ia muito regularmente ao Instituto Franco-Português ver os ciclos de cinema francês e não perdia uma única Festa do Cinema Francês no São Jorge. Embora esteja ciente de que a maior comunidade estrangeira em França seja a comunidade portuguesa fico sempre surpreendida cada vez que encontro um novo restaurante, café ou pastelaria com produtos portugueses. Diria que em França as pessoas valorizam muito mais os nossos produtos que nós portugueses em Portugal. Cada vez se encontram mais lojas de criadores portugueses (como a eNeNe no Marais) ou se veem exposições de artistas portugueses (o Vhils no Centquatre). Pessoalmente adoro estas duas cidades, muito embora sinta que Lisboa é ainda a minha ‘casa’, a verdade é que sempre que volto de férias a Portugal sinto esta saudade crescente de voltar a Paris e vice-versa. Adoro Lisboa pela luz, pelas cores e musicalidade, pelo mar e a sua brisa, da mesma forma que adoro Paris pela imprevisibilidade das suas possibilidades, pelos apéros ao fim da tarde sentada no cais do rio Sena e pelos passeios noturnos sob as luzes da Cidade Luz.”
Elodie Piège
Diretora-geral dos restaurantes Le Grand Restaurant, Clover Green, Clover Grill e La Poule au Pot, em sociedade com o marido, o chef Jean-François Piège.
Nasceu em Toulouse nos anos 80, filha de pais portugueses. “Mesmo que na minha infância não tenha sido imersa na cultura portuguesa porque os meus pais queriam integrar-se na cultura francesa, sou muito ligada a Portugal. Visito a minha família várias vezes por ano. Ao longo dos anos e com o nascimento do meu filho tenho querido descobrir as minhas raízes e alguns lugares deste País que nunca vi. Sou muito sensível à Moda, à arte e à cultura de Portugal. É um País em expansão total e infelizmente não é suficientemente reconhecido por isso.”
Créditos | Roos: top em malha de algodão, DIESEL BLACK GOLD. Calças, Very Versace, em ganga, € 880, VERSACE. Elodie: casaco em algodão e nylon, SAINT LAURENT. T-shirt em algodão, UNIQLO. Óculos em metal, RAY-BAN.
Créditos | Camisa em cetim de seda, ACNE STUDIOS. Calças em algodão com fio de lurex, DIANE VON FÜRSTENBERG. Sapatos, Cecil, em pele metalizada, TIBI.
Créditos | Carlos: casaco em nylon, € 350, STONE ISLAND. T-shirt em pele, € 350, ADIDAS Y-3. Calças em algodão, € 120, CARHARTT. Mélanie: vestido em cetim, € 275, SANDRO. Sapatos em algodão, € 85, CONVERSE. Jean-Paul: camisa, € 210, T-shirt, € 80, calças, € 220, ténis, € 420, em algodão, tudo AMI. Fátima: casaco em algodão feltrado, MULBERRY. Roos: camisa em malha lurex e calças em lamé, € 450, ambos ALBERTA FERRETTI. Sapatos, Cecil, em pele metalizada, TIBI. Nelly: casaco em algodão com strass, CHRISTOPHER KANE. Sapatos em algodão e PVC, € 65, CONVERSE.
Carlos Freixeda
27 anos, PR Manager na OBCM Paris.
Nasceu em Bragança, mas foi para França aos dois anos. “Todo os verões íamos para Portugal com os meus pais de carro, fazíamos 16/18h de estrada. Como muitos emigrantes, chegávamos com produtos franceses e voltávamos com produtos portugueses. É um período da minha vida que sempre achei louco e às vezes inexplicável. É um link que me une com França e Portugal. Este é para mim o verdadeiro significado de ser um emigrante, um português a viver em França, que sabe onde está a sua verdadeira casa. (...) Eu vivo todos os dias a relação entre os dois países na minha maneira de ser, na minha cultura e na educação que recebi dos meus pais e da minha família. Eles ensinaram-me muito e, principalmente, deram-me o amor dos dois países. Isso moldou a minha personalidade e a minha visão do mundo. Quase sempre vivi em França, mas guardei esta personalidade portuguesa que são os nossos valores: família/humano, alegria/felicidade, força e perseverança no nosso trabalho e nas nossas vidas. França ajudou-me a ultrapassar as dificuldades e hoje deu-me uma nova família. Sou um português na alma/no coração e um francês no meu estilo de vida.”
Créditos | Carlos: casaco em nylon, € 350, STONE ISLAND. T-shirt em pele, € 350, ADIDAS Y-3. Calças em algodão, € 120, CARHARTT. Roos: vestido em crepe de seda, ACNE STUDIOS. Blusa em algodão, ISABEL MARANT. Na página ao lado: vestido em seda, DIANE VON FÜRSTENBERG. Sapatos, Kohomo, em pele gravada e pelo de pónei, ACNE STUDIOS.
Jacqueline Corado
Atriz.
“Nascida em Paris no século XX (não encontrará a minha idade em nenhuma página web, porque não tem qualquer interesse)”. “Nasci em França de pais portugueses, fiz a escola francesa e portuguesa em paralelo em Paris, trabalho regularmente em quatro línguas. Antes de me tornar atriz profissional, tirei o DEUG em Ciências Políticas e Negócios Internacionais na Sorbonne, onde fui destacada com a maior média do ano. Integrei a seguir a maior Bussiness School francesa na área das finanças, ESCP-Europe, fiz uma parte do meu MBA no México, no TEC de Monterrey, e fui uma das premiadas do concurso internacional em Ciências Políticas da Universidade de Saint Gall (Suíça alemã). Em 1995, era a primeira vez que uma portuguesa era premiada/selecionada nesse concurso (assumi a minha dupla identidade francesa portuguesa na altura).”
Crédito | Roos: macacão em algodão e pele, CÉLINE. Vestido em organza, KENZO. Sapatos em pele e PVC, € 800, LOUIS VUITTON. Jacqueline: camisa em cetim de seda, JOHN GALLIANO.
Jean‑Paul Cardoso
45 anos, International Digital Store Experience Leader.
Nasceu na região de Paris, filho de pais portugueses. “A minha relação entre França e Portugal fez-se desde a infância, período durante o qual guardamos no subconsciente o que vai fazer de nós a pessoa que seremos. Para mim Portugal é o país das primeiras vezes: primeira vez de avião, primeiras férias, primeiros banhos de mar e sol, primeiras festas/discotecas, primeiras reuniões da família toda (francesa e portuguesa), primeiros amores… Mas essa relação vai além de Portugal para navegar pela lusofonia, até à ilha de São Tomé e Príncipe, onde tenho família e onde vivi alguns anos. Portugal e a língua portuguesa são uma riqueza multicultural que estão presentes todos os dias na minha vida, através da família, da música, da cultura e das artes. Fico conectado nas redes sociais com personalidades, artistas que fazem brilhar o País pelo mundo. Ser de origem portuguesa é ser um verdadeiro cidadão do mundo.”
Crédito | Jean-Paul: camisa, € 210, T-shirt, € 80, calças, € 220, ténis, € 420, em algodão, tudo AMI. Roos: casaco em crepe de seda, KOCHÉ. Calças em seda e linho, NINA RICCI.
João Pinto
29 anos, Fashion PR na Karla Otto.
Nasceu em Portugal e mudou-se para Paris em 2011. “Portugal e França sempre conviveram naturalmente no meu dia a dia. Guardo contacto com amigos e familiares portugueses, assim como acompanho em permanência as atualidades portuguesas da mesma forma que o faria se continuasse a residir no País e, ao mesmo tempo, em Paris absorvo ao máximo a cultura e o estilo de vida franceses, uma dualidade cultural permanente. A distância nunca foi um estímulo ao desinteresse, pelo contrário: é esta distância que aclara o meu afeto à cultura portuguesa e é a saudade que catalisa o meu sentimento de pertença.”
Crédito | Roos: top em algodão e licra, € 1.800, e calções em seda, € 550, ambos LOUIS VUITTON. João: casaco em gabardina, € 210, calças em algodão, € 220, e sapatos em pele e PVC, € 390, tudo AMI.
Crédito | Camisa em organza de seda, MULBERRY.
Mélanie Neto Ferreira
29 anos, PR e Showroom Coordinator na Céline.
Nasceu na região de Paris, mas diz ser de Leiria. “Sou sportinguista, graças ao meu avô (informação importante!) e grande fã da nossa maravilhosa seleção! Tenho uma enorme coleção de corações de Viana (mais uma das minha paixões estranhas e mais uma informação crucial). Os meus avós emigraram para França nos anos 60. Integraram-se muito bem na cultura francesa, mas a portuguesa sempre foi mais forte. Tenho uma relação muito forte com Portugal. A cultura portuguesa foi sempre muito presente no meu dia a dia. Fui para a escola portuguesa dos seis aos 11 anos para aprender a ler e a escrever português e conhecer a história do País e em casa só se fala português. No meu dia a dia Portugal está muito presente. Tenho um look muito simples, o que permite integrar acessórios ou peças tradicionais portuguesas (xailes, brincos, colares de filigrana…). Passo sempre as minhas férias de verão em Leiria, e cada vez que preciso de descansar ou de matar saudades volto para Portugal. Tenho imenso orgulho de ser Portuguesa, temos um País lindo com uma cultura maravilhosa e um povo fantástico!”
Crédito | Roos: camisa em cetim de seda, ACNE STUDIOS. Calças em algodão com fio de lurex, DIANE VON FÜRSTENBERG. Sapatos, Cecil, em pele metalizada, TIBI. Mélanie: vestido em cetim, € 275, SANDRO. Sapatos em algodão, € 85, CONVERSE.
Ficha técnica
Fotografia: Anne Piqué.Realização: Nelly Gonçalves.Modelo: Roos Jasmijn Abels @IMG. Casting: Nicolas Bianciotto. Cabelos: Mike Desir. Maquilhagem: Methta Gonthier. Assistentes de fotografia: Jérôme Couderc e Jules Le Masson Fletcher. Assistente de realização: Elisa Lable.
*Artigo publicado originalmente na edição de julho 2018 da Vogue Portugal.
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