Opinião   Editorial  

Setembro 2018

05 Sep 2018
By Sofia Lucas

Aretha, the queen of soul, the queen of divas.

Aretha, the queen of soul, the queen of divas.

Reinou como a maior cantora de soul, rock ou pop de sempre, não importava o estilo que cantasse, porque fosse como fosse, aquela emoção de intimidade crua estava sempre presente na mais dura e verdadeira das vozes americanas. 

“La supreme femme noire” foram as palavras usadas por David Bowie para a anunciar na entrega dos Grammy Awards em 1975, como Melhor Voz Feminina de R&B. Nessa noite Aretha subiu ao palco e disse à multidão: “Isto é tão bom que eu poderia beijar o David Bowie!” “Só que não beijou, e eu limitei-me a sair pelo lado esquerdo do palco”, lamentou tristemente o músico, numa entrevista em 1999 – e quem mais poderia fazer Bowie passar tantos anos a lamentar um beijo perdido? 

A sua capacidade de deixar marca não se preocupava com limites. Em Respect, o famoso clássico da pop escrito por Otis Redding, Aretha não se limitou a emprestar-lhe a sua voz poderosa. Em conjunto com as irmãs que compunham o coro, criou uma brincadeira maliciosa introduzindo o seu nickname de infância – Ree, Ree, Ree, Ree – como uma marca territorial, na qual retirava a música ao próprio Otis. No clímax da sua versão, Aretha acrescenta ainda uma pausa que não está no original de Redding: “R-E-S-P-E-C-T / take out T-C-P!” (apesar de em todas as transcrições da letra esta parte ser erradamente alterada para “Take care. TCP”): o que Aretha sugere é que se retirem as letras T, C e P, transformando RESPECT em REE, o seu nome. A marca indelével da diva, escrita com o toque admiravelmente perverso que só as divas conseguem. Aretha colou a sua impressão digital a Respect, garantindo que qualquer um que voltasse a cantar a canção chamasse pelo seu nome. Incluindo Otis Redding, que desde então, e de cada vez que a cantava ao vivo, a apresentava como “uma música que uma garota me roubou”. Era para ele uma honra suprema. 

Aretha tinha a mística de alguém introvertido, profundamente ferido, que parecia tímida até abrir a boca e se transformar num dragão com voz de fogo. As suas histórias, a sua soberania, o seu reinado sempre foram sobre a música, e o respeito que impunha ao seu redor manteve a sua vida pessoal privada e longe da popularidade mesquinha dos tabloides que não conseguiram explorar as suas lutas pessoais ou tormentos mais íntimos. Aretha não queria dizer quem era, mas mostrar aos outros o que eles próprios podiam ser. O seu lado sombrio e arrogante era uma manifestação do seu poder – e tornava-se difícil não o/a admirar. 

Em 1993, uma colunista do New York Post escreveu que Aretha “deve saber que é excessiva ao usar tal roupa, mas simplesmente não se importa com o que pensamos, e essa atitude é o que separa meras estrelas das verdadeiras divas”. E a verdadeira diva fez imediatamente uso do seu direito de resposta: “Como pode ser tão presunçosa a ponto de achar que pode conhecer as minhas atitudes em relação a qualquer coisa além da música?... Quando for reconhecida e respeitada como editora de Moda, por favor informe-nos. Dificilmente está em posição de determinar o que separa as estrelas das divas, já que você não é nem uma autoridade nem nenhuma delas.” Ninguém podia falar por ela e ninguém poderia desafiar sua soberania. 

Em todo o seu lado majestoso e em toda a sombra debaixo da sua capa de diva, o poder real de Aretha deu a si mesma e a tantas outras mulheres a quem inspirou e abriu caminho, permissão para ser o que quer que fossem e assumi-lo com orgulho. “Todos nós exigimos e queremos respeito, homem ou mulher, preto ou branco. É um direito humano básico”, proclamou. 

Nenhuma cantora americana foi mais aclamada do que Aretha, e apesar de não ter tido um sucesso no top 10 desde 1985, a diva nunca se preocupou em fazer algum tipo de regresso. Sabia que estava firmemente estabelecida, orgulhosamente envolta no seu manto de mistério até ao fim. Só mesmo Aretha, a diva das divas, para cronometrar a sua grande saída de cena no mesmo dia da morte de Elvis, ofuscando totalmente o 60.º aniversário de Madonna e roubando os holofotes a Nicki Minaj, que na mesma semana lançou novo álbum, ironicamente intitulado Queen. Apenas mais uma forma de Aretha nos lembrar quem era realmente a rainha e quem construiu o trono. Tal como a sua voz e a sua música vão encontrar sempre novas maneiras de nos lembrar quem ela era e, ainda mais importante, quem nós somos. 

R.E.S.P.E.C.T. (and not just a little bit)

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