Moda   Coleções  

Em Paris, chegadas e despedidas

15 Jul 2025
By Pedro Vasconcelos

A semana de Alta-Costura Outono/Inverno 2025 deu-nos um vislumbre para as mudanças que se avizinham na indústria.

A indústria da Moda vive e respira “momentos”. Nenhuma coleção é tão valorizada como a primeira ou a última. Estamos sempre sedentos de reinvenção. Queremos o novo, diferente, inédito, nunca antes visto. Precisamos de novidade como o ar que respiramos. Felizmente para nós, a mais recente semana de Alta-Costura foi histórica. Foi a season de começos e despedidas. As maisons mais importantes da cidade não apresentaram apenas as suas propostas, mas também o preâmbulo para uma das mudanças mais drásticas que a indústria já testemunhou. Quer seja na Maison Margiela onde Glenn Martens apresentou a sua primeira coleção, na Balenciaga, onde Demna apresentou a sua última, ou na Chanel, onde a equipa de design teve a sua última oportunidade de apresentar o legado da marca antes da estreia de Matthieu Blazy, a transformação da Moda sente-se no ar. Esta semana de Alta-Costura foi o primeiro rasgão num casulo que revela uma entusiasmante metamorfose.

Comecemos pelas entradas. A primeira coleção Maison Margiela Artisanal de Glenn Martens foi um evento. Aqueles que exigem atenção, que nos fazem parar o carro para ver um live. Responsável por introduzir a sua visão para a marca, o designer conduziu uma sessão espiritual. Apresentado no mesmo edifício onde Martin Margiela mostrou a sua última coleção, em 2008, o cenário tornou-se coautor do desfile. Paredes forradas a papel rasgado ecoaram Disarm dos Smashing Pumpkins assustadoramente.

Embora algumas peças prestassem homenagem ao passado — máscaras a la Martin Margiela, espartilhos torcidos que evocavam o seu predecessor John Galliano — as propostas de Martens não foram imitações. Foram a linguagem própria de Martens, carregada de referências flamengas, silhuetas esculpidas e intensidade emocional. Um vestido transparente em plástico moldado como vidro soprado abriu o desfile. A proeza técnica que se espera da Alta-Costura foi omnipresente. Quer em saias de cabedal metálico bordadas com padrões de papel de parede do século XVI, quer em vestidos que pareciam líquidos no corpo, o designer apresentou um caleidoscópio criativo. E, ainda que seguir os passos de dois dos designers mais influentes da história da Moda seja difícil, Martens não se acanhou e, em vez, floresceu.

Se alguns se estreiam, outros preparam-se para novos começos. Na Chanel, a equipa de design apresentou a sua última coleção antes da nova era da marca: a entrada de Matthieu Blazy. Longe de temas passageiros ou artifícios visuais, a Alta-Costura Outono 2025 mergulhou no passado da maison, evocando as primeiras inspirações de Gabrielle Chanel: os campos escoceses, os cortes masculinos e o romantismo rural. O resultado foi uma coleção refinada com um charme rústico. Casacos de tweed, cortes militares e botas de couro até à coxa trouxeram robustez, enquanto penas imitaram espigas de trigo e tweed branco simulava lã de ovelha. A paleta foi assumidamente natural, com verdes secos, ocres suaves, brancos envelhecidos a suavizar a habitual exuberância da Alta-Costura. Um casaco curto com gola de pelo, combinado com uma saia de seda drapeada, não deixou de ser opulento, apenas equilibrado por um funcionalismo raro. O cenário, que imitou os salões históricos da rue Cambon com uma atmosfera campestre, reforçou esta sensibilidade. A coleção não procurou a novidade, aprofundou apenas o que já existia. Como transição entre eras, foi contida, mas segura.

Mas nem todas as maisons se sentem tão ligadas ao seu legado histórico. Que Demna seja a prova. Com o seu reinado criativo sobre a Balenciaga a terminar, o designer revolucionário apresentou a sua swan song. Mas a sua última coleção não foi uma despedida melancólica, foi uma tese final. Após uma década de controvérsia, provocação e subversão cultural, o designer georgiano sintetizou a sua visão numa última apresentação de Alta-Costura como um ato de gratidão. Pela primeira vez, Demna veio agradecer ao público no final do desfile.

Desde casacos estruturados com lapelas invertidas até corta-ventos em pleno ambiente de couture, Demna manteve-se fiel à sua missão: trazer a Alta-Costura para o mundo real. Uma homenagem a Cristóbal Balenciaga surgiu sob a forma de um casaco pied-de-poule, enquanto Kim Kardashian surgiu com uma réplica do vestido usado por Elizabeth Taylor em Cat on a Hot Tin Roof, com os próprios diamantes da atriz. A mensagem foi clara: Demna cumpriu a sua missão, provou que a Alta-Costura não é apenas um palco para artesãos, mas também para iconoclastas.

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