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Porque é que a cirurgia plástica na zona genital é mais do que uma questão de estética

27 May 2019
By Catarina Parkinson

Falámos com um dos principais especialistas de Cirurgia Plástica, Reconstrutiva e Estética em Portugal que nos explicou, através de casos reais, porque é que transformar uma vagina (ou um pénis) é muito mais do que deixá-la apenas mais bonita.

Falámos com um dos principais especialistas de Cirurgia Plástica, Reconstrutiva e Estética em Portugal que nos explicou, através de casos reais, porque é que transformar uma vagina (ou um pénis) é muito mais do que deixá-la apenas mais bonita.

©iStock
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Afinal, como é que há tanto para dizer sobre uma parte do corpo que está tapada e escondida 90% do tempo? Às vezes, apetece dizer “uma vagina é só uma vagina e um pénis é só um pénis”, mas todos sabemos que isso é impossível. Primeiro, porque nem todas as pessoas nascem com órgãos genitais, ou, pelo menos, nascem com o órgão completamente formado. Foi assim que o médico e cirurgião Zeferino Biscaia Fraga, da clínica Biscaia Fraga, começou na área – a fazer cirurgia reconstrutiva de órgãos genitais, nas palavras do médico, reconstruir o que não existia. Esta é área mais complexa da cirurgia íntima.

Depois, porque a vagina e o pénis são grandes fontes de prazer e instrumentos essenciais no milagre da vida, o bisturi e as mãos experientes de um cirurgião também podem apenas melhorar o que já existe. Estas são consideradas cirurgias estéticas, mas vão muito além de alterar uma parte do corpo que é nossa e que partilhamos com quem quisermos. Quando se transforma uma parte do corpo tão íntima, tornando‐a mais bela, os efeitos vão para lá do que está à vista. De repente, tudo pode mudar e voltar a fazer sentido. É como se pudéssemos voltar a ser nós mesmos ou como se descobríssemos uma nova parte de nós.

De acordo com o artigo de opinião escrito em 2014 a propósito das cirurgias íntimas pelo especialista em ginecologia e obstetrícia Pedro Vieira‐Baptista, as primeiras referências a cirurgia vulvar puramente estética remontam aos finais da década de 70 e início da de 80. O médico refere ainda que a experiência adquirida nas cirurgias de transgénero têm contribuído para a explosão da oferta. Entretanto, dados partilhados pela Sociedade Internacional de Cirurgia Plástica Estética em 2017 indicavam a vulvoplastia como uma das maiores tendências em crescimento nos últimos dois anos (aumentou 45% em todo o mundo com o Brasil a liderar com o maior número de casos operados).

Para Biscaia Fraga, a situação tornou‐se muito mais patente e evidente a partir do momento em que se começou a fazer a depilação total. Desde que as mulheres começaram a depilar mais a região genital, que a vagina passou a ser mais o centro das atenções. Entre a emancipação da mulher – que fez do prazer feminino um direito mais que adquirido – e a cultura do belo e do poder da transformação física, vivemos hoje uma quase tempestade perfeita onde não há vagina que não possa atingir todo o seu máximo potencial.

As “asas de morcego”

A vulvoplastia é de longe a cirurgia mais frequente no que toca aos órgãos genitais femininos. O nome técnico traduz‐se, na prática, na redução cirúrgica das dimensões dos pequenos lábios. O médico explica que a mulher pode nascer já com esta fisionomia (ou seja, é algo congénito), mas que a grande maioria se revela depois da puberdade, como consequência dos efeitos hormonais. Neste caso, há um aumento exagerado de hormonas femininas. “Tenho uma jovem de 16 ou 14 anos cuja mãe estava muito preocupada com o desenvolvimento dos genitais da filha porque parecia uma mulher de 40 anos”, partilha. Mas há mulheres que chegam a viver anos com esta condição antes de procurar um médico especialista. “Tive uma senhora de 50 anos que tinha uma hipertrofia [aumento] impressionante e fazia relatos de que na intimidade com o marido se sentia altamente inibida porque quando estava a ter relações sexuais, aquilo parecia um comboio a apitar”, partilha Biscaia Fraga.

Apesar deste tipo de cirurgia ser considerada uma cirurgia estética, é importante referir que na maior parte dos casos é uma intervenção vital para melhorar a qualidade de vida. Não se trata apenas de embelezar uma zona do corpo que pode provocar inseguranças e uma baixa autoestima. Muitas vezes, há um grande risco de desenvolver infeções (com a fricção provocada durante o ato sexual ou noutras circunstâncias como andar de bicicleta) e pode provocar também um grande desconforto físico. Mostra‐nos ainda o caso de uma jovem paciente que tinha um pequeno lábio consideravelmente maior que outro. Ao comparar o antes e o depois, o resultado final é tão natural que, a um olho pouco treinado como o nosso, é difícil identificar exatamente o que foi feito. É óbvio que os pequenos lábios foram reduzidos, mas a intervenção aconteceu de forma a parecerem que pertencem naturalmente àquela fisionomia.

Para isto acontecer, o médico alerta que é necessário ter muita sensibilidade porque se trata de uma zona, lá está, muito sensível. É frequente muitas jovens chegarem à sua clínica e pedirem para “tirar o máximo possível”, mas Biscaia Fraga é o primeiro a dizer que isso não é possível. “Em termos médicos, isso não é adequado porque isto é uma zona de alta sensibilidade, de uma sensibilidade muito especial, de maneira que o que é feito é que o pequeno lábio deve ter no mínimo um centímetro de altura em relação à base”, explica. Voltando ao caso que estávamos a ver, conta-nos que para alcançar a harmonia ideal, não só os pequenos lábios foram modelados como os grandes lábios foram aumentados e até a parte do clitóris foi retocada. É aqui que percebemos que esta profissão tem tanto de ciência como de arte. Aliás, se tivesse que definir em percentagens, o médico diz que tem 60 a 70% de arte e o resto de técnica.

A técnica

Uma das principais razões da popularidade das cirurgias aos órgãos genitais (e não só) é a variedade de métodos disponíveis para alcançar o resultado desejado. Muitos médicos aplicam substâncias como a toxina botulínica ou outros fatores de crescimento e utilizam substâncias frequentemente aplicadas em outras áreas do corpo como ácido hialurónico. A palavra cirurgia pode assustar, mas, na verdade, não há nada a temer. É importante encontrar um especialista com muita experiência na área e que seja capaz de gerir e ir ao encontro das suas expectativas (que devem ser realistas, claro).

Biscaia Fraga é apologista do método que passa por utilizar o próprio tecido adiposo da pessoa. O tecido é aspirado por um aparelho específico para o efeito e depois tratado numa centrifugadora programada para a tarefa, conseguindo deixar a gordura que será aplicada com uma densidade muito semelhante à dos tecidos. Esta é a cirurgia mais biológica possível e, apesar de a pessoa continuar a evoluir natural- mente, os seus efeitos são duradouros e não desaparecem ao fim de meses ou alguns anos. Normalmente, qualquer intervenção estética feita à vagina não demora mais de uma hora, é feita com anestesia local e ao fim de 21 dias está apta a voltar a praticar relações sexuais.

Mesmo assim, muitas vezes, a cirurgia é o último recurso. Recentemente, Biscaia Fraga recebeu na sua clínica um homem com um dos pénis mais pequenos que já viu. O rapaz de 22 anos tinha um pénis de uma criança de dois ou três anos de idade. Nestes casos, um órgão deste tamanho é considerado uma anomalia e nem é possível fazer um aumento, mas sim uma reconstrução. Depois de ter feito hormonoterapia, porque o problema assentava na falta de testosterona, nada se alterou e uma cirurgia reconstrutiva seria a única solução. Contudo, o rapaz saiu de lá sem operação marcada. É que como Biscaia Fraga nos conta, o rapaz é pastor de uma igreja e só pode avançar com o procedimento caso o bispo autorize.

Like a virgin

Voltar a ser virgem, que é como quem diz, reconstruir o hímen. À primeira vista, esta cirurgia pode parecer desnecessária porque tem um efeito meramente momentâneo, mas Biscaia Fraga diz-nos que há fundamentalmente três razões para o fazer. “Ou é um motivo dramático, ou é um motivo étnico ou religioso, ou é um motivo supérfluo, esta classificação é da minha autoria”, explica.

Quando fala em motivo dramático, o médico refere o caso de uma jovem que vivia numa aldeia no Interior de Portugal e que depois de um namoro de cinco anos em que o namorado acabou por desaparecer, conheceu um senhor com uma postura social mais conservadora. Agora, a senhora gostava dele e queria casar-se virgem. Este “pormenor técnico” era muito importante para ela porque, na aldeia, toda a gente a conhece. “Para esta paciente foi de tal forma dramático que ela na consulta chorou muito”, acrescenta o médico.

Existem ainda as situações igualmente dramáticas de jovens que pertencem à etnia cigana ou muçulmana, onde casar virgem é uma questão de honra para a comunidade e nestes casos, pode, segundo o médico, existir mesmo iminência de morte. Felizmente, a cirurgia permite reproduzir perfeitamente o hímen através da reconstrução, que é feita aproveitando os tecidos que existem no introito (entrada) e depois uma plicatura (onde os tecidos se sobrepõem) com uma sutura.

Evolução humana

De entre todas as cirurgias disponíveis para fazer à região íntima, existe uma que pode suscitar alguma curiosidade. A lipoescultura da região púbica (conhecida como monte de Vénus) pode parecer, à primeira vista, apenas uma extensão ou variação da típica e muito conhecida lipoescultura abdominal. Acontece que esta cirurgia tem um grande propósito, é cada vez mais frequente e promete tornar-se ainda mais necessária.

Biscaia Fraga explica que tanto o homem como a mulher estão a aumentar de volume cada vez mais e que, consequentemente, os órgãos genitais não aumentam proporcionalmente. É o chamado “avental” que acaba por se sobrepor e “tapar” os órgãos. “Eu cheguei a tirar um litro de gordura só do monte de Vénus, por isso imagine”, acrescenta.

Esta intervenção não é benéfica apenas para quem deseja voltar a olhar para baixo e conseguir ver as suas partes íntimas. Pode vir a tornar-se algo igualmente incómodo e até perigoso. “Tenho o caso de uma cozinheira que se queimava frequentemente no forno porque antes de chegar lá com as mãos, já lá estava a barriga. Ficou com uma queimadura de segundo grau”, revela o médico.

Segunda vida

É o que se pretende fazer com a vaginoplastia, vulgo, estreitamento ou aperto da vagina, para que ela “volte” basicamente aos seus 18 anos de idade (quase). O objetivo é devolver tonicidade às paredes vaginais que, ao longo dos anos, possam ter perdido a elasticidade por diversos motivos, sendo um dos principais, os partos. Tal como se pode fazer um lifting mamário ou uma abdominoplastia para recuperar a forma de uma (ou várias) gravidez, a vaginoplastia pode ser uma das melhores maneiras de devolver alguma qualidade de vida e bem-estar a mulheres que perderam sensibilidade nesta área.

Contudo, parece que muitas vezes há falta de aconselhamento por parte dos ginecologistas em recomendar esta possibilidade. Biscaia Fraga dá como exemplo particular desta realidade uma senhora de 45 anos que depois de seis partos eutócicos procurou a sua ajuda. Ela partilhou com o médico que chegou a visitar dois ginecologistas queixando-se de que algo não estava bem (porque a sensação não era a mesma) e que ambos a examinaram e concluíram que estava tudo “normal”.

O que os médicos queriam dizer era que não tinham encontrado nenhuma inflamação, infeção ou tumor na região íntima, mas a paciente continuava a dizer que algo se passava porque se lembrava perfeitamente como era ter sexo com o marido antes das gravidezes e que agora, era algo completamente diferente. Estava de facto com uma parede vaginal muito flácida e a intervenção iria devolver-lhe tudo o que tinha deixado de sentir.

Mais uma vez, Biscaia Fraga repara esta situação recorrendo ao próprio tecido adiposo da mulher. Há duas opções: ou o relaxamento da parede é considerado moderado e é apenas reforçado com tecido adiposo ou o relaxamento é considerado mais gravoso e é necessário reconstruir os músculos. O médico explica que neste caso, a mucosa da parede é levantada para revelar os músculos e que estes são ligados um ao outro e depois suturados e apertados. Algo como se estivéssemos a apertar um espartilho. No fim, o que sobra da mucosa é retirado.

Uma questão de tamanho

Ou, como o médico gosta de chamar, a síndrome do balneário. No campo das cirurgias feitas à região íntima, o aumento do pénis continua a ser a mais popular. Os números falam por si: o médico já operou mais de três mil pénis e chega a operar cinco por dia, enquanto vaginas rondam as duas por semana. A experiência do médico diz-lhe que os homens ainda estão muito sujeitos a uma grande pressão psicológica relativamente ao tamanho do pénis. É algo que pode começar muito cedo, quando vão para a escola e têm aulas de ginástica e ficam nus à frente dos colegas no balneário e que pode influenciar o comportamento e a vida social da pessoa durante muitos anos.

Para ilustrar melhor a pressão psicológica a que os homens estão submetidos relativamente ao tamanho do pénis, Biscaia Fraga partilha um caso que o marcou particularmente. “Um jovem de 23 anos apareceu com uma jovem de 30 toda muito vaporosa. Perguntei-lhe o que o trazia à minha clínica e ele começa um pouco atrapalhado a contar que já sabia que tinha um problema. ‘Eu já sabia que tinha aqui um problema, sabe, tive um namoro durante três anos que não foi muito bem-sucedido e eu já tinha desde os meus 12 ou 13 anos a certeza que tinha aqui um problema. O meu órgão é muito pequeno e, pronto doutor, depois deste tempo todo e ter sofrido um bocado, acontece que tenho aqui uma namorada que é muito experiente e... diz lá ao doutor o que achas?’”

Biscaia Fraga conta-nos que sem qualquer pudor ou delicadeza, a namorada respondeu que não era pequeno, mas sim muito, muito pequeno. O médico diz que este tipo de observações são arrasadoras. Neste caso específico, apesar de o homem ser considerado um caso borderline– que está próximo do limite mínimo da escala, mas que não é considerado doença –, Biscaia Fraga decidiu fazer a cirurgia por considerar que seria uma intervenção que iria beneficiar muito a qualidade de vida do paciente. O médico guia-se normalmente por uma escala que começa nos sete centímetros de comprimento em repouso e 11 centímetros de comprimento em ereção para considerar (do ponto de vista médico) um pénis pequeno.

Como acontece com o sexo feminino, também parece não haver limite de idades para este tipo de intervenções no masculino, principalmente com a quantidade de fármacos que existem hoje em dia para ajudar a manter uma vida sexual ativa por largos anos. O paciente mais velho que Biscaia Fraga já tratou tinha 89 anos. O que o senhor queria fazer era “compor” o órgão, porque já o tinha operado uma primeira vez. “O problema deste senhor é que o seu urologista em Madrid colocou-lhe uma prótese no pénis. Quando existe uma prótese, ao fim de algum tempo, fica tipo pedra, duro e acaba até por doer e não funcionar corretamente porque os tecidos se retraem. Ele soube que eu me dedicava a esta arte e aquilo que fiz foi colocar tecido para almofadar a área à volta da prótese. O senhor acabou por ficar com o pénis maior, muito mais almofadado e a funcionar. Está radiante e já cá veio três vezes fazer sessões de terapia”, conta-nos. 

Artigo originalmente publicado na edição de maio de 2019 da Vogue Portugal.

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